Milton Hatoum é um escritor que já há muito tempo tinha vontade de conferir. Como obteve reconhecimento com seus romances e é considerado bom escritor pelas resenhas de jornais e revistas de grande circulação, queria saber se ele estava mesmo com essa bola toda. Afinal um ganhador de tantos prêmios deve ter suas qualidades. Por isso foi com muita expectativa que adquiri seu último romance, o Cinzas do Norte que é de 2005 e vencedor do prêmio Jabuti de 2006, segundo me informa a leitura da orelha do livro. E minhas expectativas não foram em vão, de fato é uma boa história.
Os elementos que prendem a atenção estão todos lá. O narrador é em primeira pessoa, mas não é o protagonista. É o que chamamos narrador testemunha, ele, Lavo, conta a história da família de Mundo, um rapaz que quer ser artista. No entanto, sendo filho de Trajano Mattoso, um rico exportador de juta, vê os seus planos se complicarem devido à dificuldade de relacionamento com o pai. As famílias do narrador e do protagonista têm relações fortes, porque a mãe de Mundo, Alicia, mantém um caso com um tio de Lavo, Ranulfo, desde de antes do seu casamento com Trajano.
A violência nas relações entre pai e filho; o pai incapaz de compreender um filho que não quer ser herdeiro de seu império, mas sim ser artista; o fato de a mãe não dar a menor importância ao marido, preferindo a jogatina e a bebida, além de viver um casamento de aparências, baseado em interesses, já que seu amor é destinado apenas ao amante, culminam na dissolução da família. Tudo isso tendo como pano de fundo a ditadura militar, o que piora ainda mais a falta de entendimento entre as duas gerações, visto que Mundo se revolta contra os militares, aos quais o pai venera.
É um romance que tem motivos edipianos: o relacionamento mãe sedutora, pai violento e filho que sente adoração pela primeira e hostiliza o segundo, é enredo perfeito para especulação ao estilo freudiano. O que torna a história bem universal e mesmo a ambientação na cidade de Manaus, retira o autor do risco de ser considerado regionalista. Literatura regionalista é um rótulo que todos os teóricos desejam amarrar aos escritores que escrevem do interior do país. Mas não se pode dizer isso deste romance, é uma história que não tem pátria, esse difícil relacionamento em família, as incertezas geradas no filho pelo comportamento dos pais.
O fato é que Cinzas do Norte merece ser lido. É bem escrito, tem um enredo complexo, o narrador como não participa dos fatos ocorridos pessoalmente, conta uma história que ele mesmo conhece de maneira fragmentária. O que torna o todo muito mais interessante para o leitor, pois os mistérios da trama vão sendo revelados aos poucos. Isso prende a atenção do começo ao fim da leitura. Diversão garantida e sem as simplificações de Best Sellers.
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