Há uma lembrança da minha infância que sempre me incomoda. É a idéia que eu tinha de que sempre estava repetindo o gesto de alguém. Não que estivesse sempre brincando de sombra, e seguindo as pessoas para imitá-las. Era um pouco mais bizarra do que isso. Acreditava que em todo lugar do mundo havia uma menina parecida comigo repetindo os mesmos gestos que eu. Por exemplo, se estivesse tomando banho, fazia esculturas com o cabelo ensaboado de xampu, e aí pensava: deve haver uma outra garota, uma menina africana talvez, que agora nesse mesmo instante está também lavando os cabelos e fazendo esculturas com a espuma do xampu. Por que será que num mundo com tantos bilhões de habitantes só eu estaria fazendo isso? Se estivesse trançando os cabelos, por que não poderia haver uma chinesinha do outro lado do mundo trançando os cabelos também? E quando a minha mãe me chamava para comer, milhares de outras mães estavam chamando também suas filhas. E quando eu me sentava à mesa, todas as outras meninas sentavam junto.
O problema é que muitas vezes eu me pegava pensando que isso tudo era um sonho. Que aquelas meninas não existiam de fato e eram só imaginação, ilusão, coisa da minha cabeça. Até aí, tudo bem. O problema era quando eu me indagava: e se eu fosse a imaginação de uma delas?
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