domingo, 24 de maio de 2009

As naus e a reconstrução da imagem nacional de Portugal

A narrativa de Lobo Antunes não é fácil de ler, pelo contrário. Não podemos dizer que o autor privilegia a forma em detrimento ao conteúdo, mas acreditamos que o trabalho com ambos os lados do texto é feito com muito vigor. Neste romance em especial pudemos perceber todo o talento literário do autor que, com o auxílio da paródia, nos apresenta a história de Portugal através de seus grandes heróis. Tratando principalmente daqueles heróis das navegações os quais fizeram de seu país um grande império séculos atrás, por isso o título sugestivo do romance: As naus.
O caráter parodístico da narrativa se dá na forma como são tratados esses heróis, rebaixados no romance, apesar dos seus grandes feitos e do nome conhecido dos livros de história, em pessoas comuns e, ironicamente, vivendo todos numa Lisboa atualíssima. Os grandes nomes da história portuguesa perdem a sua nobreza e são colocados diante de uma Lisboa feia e prostituída num momento pós-colonial no qual foram obrigados a voltar das colônias africanas. De volta à terra natal, sem recursos e sem riqueza, a fama valendo apenas como um jeito de as pessoas se divertirem com eles, personagens famosos, entre os quais, Pedro Álvares Cabral, Diogo Cão, Luiz Vaz de Camões, se encontram na mais absoluta miséria. Sendo que um vive da prostituição da esposa mulata, outro é alcoólatra, e o terceiro praticamente um mendigo.
A idéia que percorre todo o romance é a de dessacralizar as figuras que fizeram a história do Portugal Império, o qual, logo após a independência de suas colônias deixou de ser o mesmo e passou a se procurar novamente. Discutir o que virá a ser esse país que não é mais o que pensava ser e que precisa de novos contornos e talvez de heróis menos pomposos que os corajosos navegadores, aqui caracterizados como marinheiros desempregados, porque a nação não precisa mais deles. Como as altas figuras não são mais necessárias acabam por ser rebaixadas a escória social e nivelados como seres marginais, que vivem na periferia da cidade de Lisboa, de cabaré em cabaré. Segundo Álvaro Cardoso Gomes, os romancistas portugueses “estabelecem um diálogo entre passado e presente, com o objetivo de exorcizar a lembrança, altamente idealizada, de um império colonial português” (GOMES, 2005, p.350). No caso de As naus, o passado é presentificado em seus personagens históricos que se apresentam como seres degradados caminhando no presente de maneira concomitante.
A imagem mais clara desse Portugal degradado é a do pai morto que Camões carrega e não sabe o que fazer dele. O pai é sem dúvida o país que acabou de morrer, porque já não há mais império. Assim como aparece inútil sua tentativa de escrever a sua famosa epopéia diante de uma realidade tão infeliz a que o país chegou num futuro que não era desejado e nem passível de ser louvado. Se como diz Eduardo Lourenço, “Portugal existe porque existiu e existiu porque Camões o salvarguadou na sua memória como a dos Hebreus se perpetua na Bíblia” (LOURENÇO, 1999, p. 108), nessa nova epopéia que As naus pretende se tornar, acontece o contrário: todo o passado se torna desprezível e por isso risível. Pareceu-nos que a angústia desse novo país que está surgindo depois de uma séria crise de identidade é de não ser unicamente um país de passado louvável. A idéia que perpassa o texto é: vamos rir desse passado, vamos torná-lo menos pesado. Talvez seja desejo até deixar de dar importância a esse passado volumoso e trazer os olhares portugueses para o presente, pois é com o presente que se faz o futuro. Daí a “presença” desses heróis antigos de maneira concomitante no mesmo e degradado presente.
Fazer surgir uma nação que não se baseia exclusivamente em passados heróicos, mas que se delineia diante de uma Europa a qual não se assemelha parece difícil. Tanto que os portugueses representados por um bando de tuberculosos ainda esperam, ao final da narrativa, por uma salvação vinda de uma figura mítica que assombra a todo o momento as personagens: D. Sebastião. Este é esperado diante do mar ao amanhecer de uma nova era, e como se sabe, provavelmente, nunca virá. E os tuberculosos terão de se conformar com o que tem e curar-se com os seus próprios recursos. O amanhecer em si reflete uma esperança no futuro, mas esse futuro não pode mais vir de fora, pois não existem mais colônias, os portugueses precisam agora contentar-se com os seus recursos interiores, e sem depender de um passado mítico.
O Portugal acostumado a ser um país de dimensões continentais e vincular a sua imagem às colônias africanas e ao Brasil, agora precisa se acostumar com seus próprios limites e conformar-se a ser um país “que deu a volta ao mundo para tomar medida de sua maravilhosa imperfeição” (LOURENÇO, 1999, p. 152).

2 comentários:

  1. Nada é por acaso, mas por acaso encontrei vc,
    Nada é´por acaso, mas por acaso também gosto de ler,
    Nada é por acso, Deus fez tudo como tem q ser,
    Nada é por acso , Por acaso tambem gosto de ler,
    Nada é por acaso, sou poeta sem querer,
    Nada é por acaso, tambem gosto de musica , e agora musico vc.
    Nada é po acaso, por acaso gosto de escrever,
    Nada é por acaso, por acaso gosto de desenhar,
    Nada é por acaso, por acaso quem é vc.
    Nada é por acaso, por acaso Não é mesmo por acaso, q gostei do que posso, agora ver.
    Naturalmente...VC

    ResponderExcluir
  2. interessante com o somos tão presentes no passaso e no futuro.
    diassezaron@gmail.com

    ResponderExcluir