"As palavras são muito bonitas também porque têm significados cicatrizados nelas", com essa frase de Ondjaki podemos chegar a diferentes conclusões. Numa delas, a que nos interessa mais, poderíamos dizer que os textos verbais (as palavras) são cheios de significados, porém não é qualquer significado, mas apenas aqueles que estão "cicatrizados" nelas.
Mas como descobrir esses significados? Para isso precisaríamos ler de fato, ou seja, ler compreendendo e fruindo. No caso de a leitura ser de uma obra de arte é ao extremo necessário ser um leitor. O que pode ser entendido como a pessoa que é capaz de ler e ao mesmo tempo aprender, discordar e contemplar com toda sensibilidade estética que tem.
Um leitor destrói o texto que o escritor construiu. Quem lê de verdade não é apenas um ledor, é um devorador do texto que é digerido no cérebro. O leitor transforma o texto em partes menores para depois reconstrui-lo com sua própria visão. O que o faz tão responsável pelo significado do texto quanto o autor.
A devoração de um texto descobre os significados cicatrizados nas palavras. O leitor não dá significados aleatórios aos textos que lê. Mas também não fica só na superfície do texto como faria um simples ledor. Devorar o texto não significa desrespeitar a intenção do autor. Também não quer dizer inventar novos significados que o texto não apresenta.
A devoração é a compreensão que se dá dentro do texto de suas multiplicidades semânticas. Todavia, ao devorá-lo, o leitor transforma o texto em parte de si mesmo e se alimenta dele. Isso acrescenta algo de valor ao texto, o valor de uma outra visão que é diferente da do autor.
O leitor não desrespeita o autor e o texto, mas acrescenta uma nova forma de ver o texto com a sua leitura/devoração. A leitura/devoração ultrapassa a contemplação e a compreensão apenas. Ela renova o texto tornando-o parte do mundo do leitor e, até mesmo, parte do próprio leitor que modificando o texto modifica a si mesmo.
A leitura/devoração é uma troca. É a mais profunda das relações entre os seres humanos: o diálogo amoroso ou a fusão amorosa de diferentes ideias. Ideias que não se repelem mas se transmutam dialeticamente em novidade. Novidade para o texto e para o leitor.
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