Frase II

... porque o sol depois da chuva limpa os olhos
e nos arrasta para o silêncio barulhento
das aves

frase

A noite que sou eu
                             me pesa nos olhos

Hoje é o Dia Mundial do Vegetarianismo

...

o que eu posso fazer?
se a vida é um engano
se o certo parece um rumo incerto
se tudo é sempre profundo vazio
se às vezes eu só queria o teu braço
se quase sempre é quase nunca te ter
o que eu posso fazer?

teus olhos meu clarão

Choro

uma névoa tênue
embaciando a vista

palestra

Animal sonhador

de olhos arfantes
correndo vias
endireitando os ombros
sonhando forte
nem sabe ao certo quem é
mas sabe exato quem não quer ser

escravo das horas distantes de um futuro burro que é seu eterno presente

(sonhei com um gato sem patas e tive pena

                                                                      quando acordei

                                          quem estava sem patas

                                                                                                                 era eu)

passeio

passeávamos de mãos dadas
eu e você pelos campos sedosos de um lençol
e o seu perfume se confundia com o das flores do caminho

penso em ti poeticamente

penso em ti poeticamente
e sempre gostaria de ser-te
nas nuvens do céu que assombram
as gotículas miúdas de ti
que ressentem antigas sensações
de um horizonte em que sol se esvai
e meus olhos vão-se com ele
a pensar em ti
a sonhar-te aqui
e os primeiros sopros de ti
são os que sopram-me no peito arrepios

quantas coisas meu querer não alcança

quantas coisas meu querer não alcança
tanta vida imaginada brotando fácil dos anéis dos meu cabelos

do tanto que eu não te tenho, amor
é o tanto que eu te quero ao meu lado

o cansaço tomou conta de mim

o cansaço tomou conta de mim

todos os meus músculos doem em algum momento do dia
a minha garganta arranha quando falo e também quando estou em silêncio
os meus ossos estalam ao menor movimento
meus cabelos caem e os novos fios nascem brancos
é só cansaço ou finalmente estou ficando velha?
ah! a velhice aos trinta e poucos anos...
faz pouco tempo que me descobri na menopausa
tenho mesmo de fazer uma pausa
e observar...
meu corpo
minha pele
a implosão dentro de mim
de um nada
de um vazio
que não me diz e me atormenta
tenho mesmo que ser alguém o tempo todo?

o cansaço tomou conta de mim

Glass Walls

Sangue

há sangue no meu coração
há sangue nas minhas veias e artérias
há sangue sob e sobre a minha pele
há sangue nos meus órgãos internos
há sangue nas minhas roupas
há sangue em tudo o que vejo e em tudo que toco
há sangue por todos os lados

o ar que respiro é sangue
a comida que eu como é sangue
a água que eu bebo é sangue

seu beijo tem gosto de sangue
suas mãos me tocam o sangue
estamos submersos neste quarto lotado de sangue
vomitamos amor e sangue
cagamos amor e sangue
mijamos amor e sangue

somos feitos disso: de amor e de sangue

a lua

a lua no céu transpira
um amor de véspera
saudades recentes
de um calor solar
que nunca se pôs

I love your smile

Existo

Existo
nas sombras do silêncio
empurrando pedras morro acima

Bom dia!

uma manhã ensolarada e quente
desejos de felicidade ressoam no ar
os cães ladram à porta a te chamar
os pássaros não te deixam dormir
as plantas espreguiçam flores a se exibir
a solidão já não é um problema
porque o amor paira em outro lugar

as rosas

:as rosas no parapeito:

- esperam ser colhidas
no estreito -

                           (leito de um raio de sol)

Emily Dickinson

O Coração tem muitas Portas -
É só chamar -
Na expectativa de um amável
"Pode entrar" -
Sem me abater uma recusa,
Resta insistir -
Nalgum lugar Supremacia
Deve existir -

The Heart has many Doors -
I can but knock -
For any sweet "Come in"
Impelled to hark -
Not saddened by repulse,
Repast to me
That somewhere, there exists,
Supremacy -


tradução José Lira

Bom dia!

Desejos de ano bom

quero exatamente o contrário
do ano passado
começar o ano no dia 24 de janeiro
receber os ecos das suas minhas lembranças
e ir longe longe de tudo o que não sou
ficar com os dois pés no freio
outros olhos no meu seio
outros lábios no meu seio
desejo outro beijo
um ano bom
para mim
e para você
só eu
sem segredo
e sem medo

Réquiem

quando aprendi a dizer sim

esqueci como se diz não 

toda vez que ele me olha

corro para aqueles braços

que me enlaçam e me acalmam

e me dizem que há luz no fim de tudo

toda vez que ele me quer

estendo-me na cama

e aceito a chama

mas canto do meu canto

um réquiem

agudo

para os seus ouvidos surdos

que não sabem que eu já fui

pois dos desertos abertos do meu sexo

repito o tanto de pranto 

que me lavou

e ressurjo 

tipo fênix

das cinzas

um dia depois o outro,