segunda-feira, 6 de julho de 2009

Lembrança de infância II

Sempre que me olho num espelho me vem à mente uma recordação. Uma menina magrela diante do espelho em casa segurando outro espelho menor. Observa a menina, que sou eu, as imagens de um espelho dentro do outro se multiplicarem infinitamente. Mas, mesmo dentro da minha limitada sabedoria sobre ótica, sabia em menina e o sei também agora que a idéia de infinidade era uma ilusão, pois afinal só havia dois espelhos: aquele que estava dependurado na parede e o que estava em minhas mãos. Daí me surgia a dúvida: existe o infinito? Em percebendo a vida, logo respondemos que não. É fácil notar que tudo que vive, morre. Tudo que começa, acaba. Assim como a felicidade não dura para sempre, também o sofrimento um dia tem um fim. Então, a inexorabilidade parece ser certa.
Mas respostas fáceis tendem a ser de fácil contestação. Nada dura para sempre, mas tudo se transforma e recomeça, e se repete também sem interrupção. Ao mesmo tempo que morre o avô nasce o neto, e a família continua nos traços de um que voltam no outro. O infinito não existe, mas tudo continua apesar da nossa sanha de avançar ao encontro do nada. E dentro desse contínuo que somos nós nos repetindo, o infinito existe indubitavelmente, porque o fluxo da vida não cessa com a morte de um.
Assim como não existe mais a menina diante do espelho, porém ela não deixou de estar fascinada pela idéia da multiplicação de espelhos mesmo não sendo mais menina. Os espelhos ainda se multiplicam em forma de pensamentos sobre espelhos que se refletem num infinito de imagens que não pode ser parado.

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